quarta-feira, 17 de julho de 2013

Extra! Extra! Notícias são prejudiciais a você, e cortá-las de sua vida o fará mais feliz, diz escritor

O quão mal informado você seria se parasse definitivamente de ler notícias? Nada de tevês, rádios e jornais. Inclusive notícias como esta, que você lê agora. Segundo o escritor suíço, Rolf Dobelli, pouca coisa mudaria em sua vida. Na verdade, ela seria melhor. Dobelli, que recentemente lançou o best-seller A Arte de Pensar Claramente (Objetiva, 210 páginas, R$ 29,90, tradução de Karina Janini), acredita que a leitura de notícias pode ser prejudicial à sua saúde mental, à sua produtividade e à sua capacidade de aprendizado, dentre outras coisas. Há três anos sem ler notícias, o autor do livro afirma: está muito bem informado com livros, algumas revistas especializadas e as notícias trazidas pessoalmente por amigos.

Num ensaio publicado no site do escritor e que dá base para seu argumento no livro, são enumeradas 15 razões pelas quais, segundo ele, você deve abandonar imediatamente o consumo de notícias. Em dado momento somos convidados a um exercício de memória: “quais são os dez principais tópicos do mês passado que já não estão mais no noticiário?”. Nossas vidas são saturadas de informação, o que pode, segundo Dobelli, causar uma falsa sensação de que estamos bem informados. Pelo contrário.

A notícia é um produto da cultura de massa, cuja característica “rasa” ou “irrelevante” apontada pelo escritor é o que marcou a produção das empresas jornalísticas no crescimento da sociedade urbano-industrial. Abandonou-se o caráter complexo – literário, como se diz – das produções jornalísticas e adotou-se uma racionalidade técnica e uma noção de objetividade que não correspondem verdadeiramente às nossas necessidades de aprendizado. Faltam humanização, pluralidade e profundidade, Na verdade, Dobelli afirma que notícias são produzidas de modo a explorar os pontos fracos em nossas mentes, como a necessidade por emoções intensas, pela simplificação de fenômenos complexos e pelo fluxo incessante de novidades.

Há outras observações que merecem atenção, como a que diz respeito aos possíveis prejuízos que o hábito de consumir notícias pode trazer à memória: há um período de transição entre a memória recente e a memória de longo prazo. O excesso de informações desordenadas ocupa espaço na memória, prejudica a concentração e impede o desenvolvimento de outros aprendizados a longo prazo. O aprendizado depende das conexões e significados que criamos entre as informações que captamos, e nem sempre as notícias são capazes de auxiliar numa compreensão global, aprofundada e complexa.
A narrativa da notícia, constituída de um recorte, dificilmente faz uma visão total e aprofundada do que ocorre à nossa volta

Por outro lado, há um tom de determinismo e paranoia em alguns dos argumentos do escritor a respeito da mídia, a exemplo de trechos como “a mídia nos alimenta com pequenos pedaços de assuntos triviais, rumores que não interessam às nossas vidas e não exigem reflexão”, ou “o consumo de notícias é irrelevante para as forças que realmente importam na sua vida”. Na melhor das hipóteses, é divertido, mas ainda é irrelevante”. E, apesar de alguns enunciados do ensaio partirem de abstrações sensatas (“Notícias nos tornam passivos”, “Notícias nos dão a ilusão de que nos importamos”), ainda carecem de argumentos igualmente enfáticos para justificá-los. Ao livro parece faltar um pouco da complexidade que ele cobra das notícias.

Será que realmente estamos bem informados ao cortar as notícias de nossas vidas? Negar a existência de um modo de produção de conhecimento também implica em negar histórias, pontos de vista e ideias que talvez não conhecêssemos de outras maneiras. E, no caso de negar a existência da notícia como fenômeno da comunicação de massa, não estaríamos também abrindo mão de um canal de comunicação com a esfera pública e criando… um conceito maniqueísta de relevância? O “relevante para mim”?

Dobelli admite ler revistas como a Science e a The Economist, e ouvir notícias através de seus amigos, que muito possivelmente são consumidores de notícias. Pois bem, então o autor admite ler uma forma de jornalismo. Na verdade a crítica não deveria ser dirigida às notícias em geral, e sim a uma modalidade patológica das mesmas.

Nas palavras de Dobelli, “as notícias são para a mente o que o açúcar é para o corpo: apetitosas, fáceis de digerir – e muito destrutivas a longo prazo”. Assim como às vezes é necessário cortarmos o açúcar para não prejudicarmos o nosso corpo, é também necessário cortar as notícias para manter a sanidade mental. Mas, também, talvez seja sensato acreditar que hábitos alimentares saudáveis são, muitas vezes, mais benéficos que dietas radicais.

Segue abaixo uma tradução resumida dos 15 tópicos levantados por Rolf Dobelli. E você, leitor, como seria sua vida sem notícias? Deixe sua opinião aí nos comentários!

1. Notícias nos desinformam sistematicamente

Nosso cérebro está programado para prestar atenção a estímulos “escandalosos, chocantes, relacionados a pessoas, com forma de histórias, rapidamente mutáveis, gritantes e gráficos”. Não estamos programados para processar formas mais sutis de informação com muita atenção, e os noticiários exploram este fato. Ignora-se os fatos importantes para criar-se sensacionalismo. Não se sabe diferenciar riscos imaginários de riscos reais. É citado o exemplo de uma ponte que desmorona quando um carro está passando sobre ela. A mídia se foca, então, no carro, no drama da pessoa no carro, e desvia a atenção do verdadeiro perigo: a construção mal feita das pontes.

2. Notícias são irrelevantes

O autor faz o seguinte convite: das aproximadas 10.000 notícias que você leu nos últimos 12 meses, nomeie uma que – por você tê-la consumido – permitiu a você fazer uma decisão melhor acerca de algum assunto sério envolvendo sua vida, carreira, negócios – comparado ao que você saberia se não tivesse engolido um monte de notícias aleatórias. O noticiário não é capaz de dizer-lhe o que é relevante (Dobelli comenta como o surgimento do primeiro navegador de internet, em 1995, mal foi noticiado por ser considerado irrelevante).

3. Notícias limitam o entendimento

As notícias não têm poder de explicação. Muitas pessoas confundem saber uma miscelânea de fatos com compreender o mundo. Apenas a novidade não é relevante, e sim os processos complexos por detrás do que acontece. Por serem incapazes de explicar coisas complexas, as notícias buscam, geralmente, o mais apelativo, que é fácil de se produzir. “As histórias mais importantes são não-histórias: movimentos lentos e poderosos que se desenvolvem abaixo do radar jornalístico, mas têm um potencial transformador”.

4. Notícias são tóxicas para o corpo

Notícias frequentemente acionam o sistema límbico. Histórias estressantes nos fazem produzir grandes quantidades de cortisol, que desregula nosso sistema imunológico e inibe hormônios do crescimento. Além disso, esse estresse pode levar a desenvolver medo e agressividade.

5. Notícias aumentam erros cognitivos

As notícias nos induzem à mãe de todos os erros cognitivos: a tendência à confirmação de crenças. Aparentemente, diante da grande quantidade de informação à deriva, filtramos aquilo que nos interessa e descartamos o que vai em direção contrária. Outro defeito cognitivo é a tendência de narrativas, histórias que deem sentidos aos fatos. Isso resulta numa análise geralmente incorreta sobre causas e consequências de fenômenos: “qualquer jornalista que escreva, ‘o mercado aumentou por causa de X’, ou ‘a companhia faliu por causa de Y’ é um idiota”.

6. Notícias inibem o pensamento

Ao estar vulnerável ao fluxo caótico de informações, você atrapalha sua capacidade de concentração, de pensar temas com clareza. Além disso, sua memória de curto prazo é seriamente afetada. Gerar concentração requer ao menos 10 minutos de leitura, e, em períodos menores, o cérebro processa superficialmente a informação, mal sendo capaz de guardá-la. O autor propõe o seguinte exercício: quais eram os dez principais tópicos das notícias um mês atrás (que já não estão hoje no jornal)?

7. Notícias mudam a estrutura do seu cérebro

Num processo semelhante ao de outros vícios, o cérebro pode desenvolver hábitos e padrões em relação ao consumo de notícias. Segundo o autor, a tendência é de que, quanto mais lemos, de mais notícias precisamos. Ele também diz que o cérebro não tem um mapeamento fixo e se adapta a novos fenômenos culturais, como é o caso das notícias. Quanto mais notícias lemos, menos treinamos nossas funções voltadas a leituras e pensamentos aprofundados, e mais dificuldade teremos quando nos engajarmos a ler um grande livro, por exemplo.

8. Notícias custam caro

As notícias custam caro por reduzir nossa produtividade significativamente. Perde-se, primeiramente, o tempo com que consumimos notícias. Em segundo lugar, levamos tempo para focar em outras coisas depois de ler notícias. Em terceiro, as notícias têm o potencial de nos distrair mesmo quando já abandonamos os noticiários, voltando esporadicamente às nossas mentes.

9. Notícias rompem a relação entre reputação e mérito

Reputação afeta como as pessoas cooperam em sociedade. Em nosso passado ancestral, éramos premiados por nossos méritos, em pequenas comunidades. Foi a comunicação de massa que trouxe a ideia de “fama” às nossas vidas. A fama é enganadora, pois as pessoas famosas têm pouca ou nenhuma relevância em nossas vidas. Enquanto isso, as pessoas realmente merecedoras de crédito não encontram canais de difusão.

10. Notícias são produzidas por jornalistas

Assim como qualquer profissão, o jornalismo possui profissionais incompetentes que não possuem o tempo – ou a capacidade – para análises aprofundadas. Na estimativa de Dobelli, menos de 10% das histórias são originais. Menos de 1% são realmente investigativas e, apenas uma vez a cada 50 anos, jornalistas são capazes de desvendar um Watergate. Soma-se a isso o fato de repórteres copiarem uns aos outros e multiplicarem informações nem sempre bem investigadas.

11. Fatos noticiados às vezes estão errados; previsões sempre estão

Atualmente, com equipes enxutas e baixo orçamento para a produção de matérias de qualidade, a checagem dos fatos pode ser uma espécie em extinção. Além disso, jornalistas que tentam prever eventos complexos do cotidiano (assim como especialistas de diversas áreas) estão fadados ao fracasso. Os jornais não previram a Primeira Guerra Mundial, a Grande Depressão, a revolução sexual, a queda do império soviético, a ascensão da Internet, apenas para citar alguns eventos. É uma aposta perigosa.

12. Notícias são manipuladoras

As notícias são geralmente selecionadas de modo a agradar patrocinadores, corporações de mídia, e também de reportar o que é consenso de outros jornais. Há diversos interesses em jogo e, se a indústria de Relações Públicas é tão grande quanto a indústria de notícias, isso é um indício de que jornalistas e organizações de notícias podem ser enganados, assim como o público em geral.

13. Notícias nos tornam passivos

O noticiário está repleto de eventos sobre os quais não temos a menor influência, o que nos induz a uma visão fatalista do mundo. Ao contrário de nossos ancestrais, que tinham domínio sobre os acontecimentos ao redor, nós somos obrigados a adotar uma visão pessimista e dessensibilizada das coisas que não podemos mudar.

14. Notícias nos dão a ilusão de que nos importamos

O bombardeio de imagens trágicas contrastando com os resultados da NBA e o mercado de ações pode dar a ideia de que estamos nos importando com o que acontece, mas o fato é que temos a sensibilidade reduzida. Num trecho deste tópico, Dobelli diz: “as notícias nos envolvem no calor de um sentimento global. Somos todos cidadãos do mundo. Estamos todos conectados. O planeta é apenas uma vila global. Nós cantamos ‘We Are the World’ e acenamos as chamas de nossos isqueiros em perfeita harmonia com milhares de outros. Isso nos dá um sentimento brilhante e confortável que traz a ilusão de preocupação, mas não nos leva a lugar algum. A alusão de qualquer coisa falando sobre uma irmandade global me parece uma grande quimera. O fato é que consumir notícias não nos faz mais conectados uns aos outros. Nós estamos conectados, porque interagimos e fazemos trocas”.

15. Notícias matam a criatividade

Aquilo que já sabemos limita nossa criatividade. É por essa razão que matemáticos, escritores, compositores e intérpretes costumam produzir seus trabalhos mais criativos ainda jovens. Dobelli afirma não conhecer uma única mente verdadeiramente criativa que seja um “news junkie”, ou viciado em notícias. Os padrões do noticiário, assim como sua distração característica, inibem pensamentos novos.

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