sábado, 17 de setembro de 2016

Formas de manejar o solo agrícola - convencional, orgânica e agroecológica

Fiz esse "resumo" para um trabalho da faculdade baseado num artigo da Dra. Ana Primavesi que está na edição de setembro/2008 da revista Agriculturas: experiências em agroecologia, que pode ser baixada aqui (caso queiram o artigo original). No meu "resumo" eu incorporei algumas coisas que não estão no artigo, mas que de qualquer forma, praticamente foi tudo pego de outros escritos também da Dra. Primavesi.
Segue o resumo integral do artigo:
O artigo discorre sobre as três principais formas de manejar o solo agrícola, que são: o manejo convencional (ou químico), o orgânico por substituição de insumos e o agroecológico.
Convencional
No manejo convencional, o solo não é tido como um meio de cultura físico-químico-biológico, mas sim como um simples suporte físico para as plantas. O artigo cita práticas deste sistema de manejo que matam os solos:
A calagem corretiva.
A matéria orgânica se decompõe rapidamente. O solo se torna duro e muito pobre, pois em clima tropical – diferente de solo temperado – o uso de grandes quantidades de cálcio compacta o solo por neutralizar a ação do ferro e alumínio, além de induzir à deficiência de vários elementos, como zinco, manganês, boro etc. Prova disso é o projeto “Tatu” em Santo Ângelo/RS, em que aplicaram até 35 t/ha em uma única vez, causando quase que a desertificação da região.
A aração profunda.
Anima explosivamente a microvida do solo e leva a uma decomposição igualmente intensa da matéria orgânica, o que faz com que, 4 horas mais tarde, uma grossa nuvem de gás carbônico paire acima da terra. Como em campo lavrado não há planta que possa aproveitar, essa nuvem eleva-se para a estratosfera, contribuindo para o efeito estufa.
A adubação nitrogenada.
Nitrogênio aplicado como sais de nitrato ou sulfato de amônio favorece a decomposição acelerada da matéria orgânica por reduzir os teores de C/N. Além disso, mata as minhocas, acidifica o solo e destrói sua estrutura porosa. Também é importante lembrar que não existem nutrientes isolados, mas sim em proporções entre si, e o excesso de nitrogênio induz à deficiência de cobre.
Agrotóxicos.
Para compensar um efeito de desnutrição vegetal causado por ele mesmo, o manejo convencional preconiza o uso de defensivos. Como cada defensivo é formado em base de algum mineral, se frequentemente usado induz a deficiência de outros minerais que estão em proporção com esse, provocando outras doenças que deverão ser combatidas por outros defensivos e assim por diante.
Numa experiência em citros pôde ser constatado que após um ano sem o uso de defensivos, as 11 doenças e pragas que havia reduziram-se a duas. Todas as outras somente eram "efeitos colaterais".
Herbicidas.
Manter o solo tropical limpo e exposto ao sol e à chuva leva a um aquecimento extremo (até 74ºC no Brasil) e a uma alta perda de água. O impacto violento das gotas de chuva com seus torós compacta o solo, impermeabilizando-o. Além disso, cada planta espontânea indica alguma situação ou problema que precisa ser corrigido. Por exemplo, o amendoim-bravo ou leiteirinha, indica a deficiência de molibdênio no solo. O herbicida mata a leiteirinha, mas a deficiência continua e se agrava a cada plantio.
Irrigação intensiva.
Em solos bem manejados, a taxa de infiltração da água é de 100 a 400 mm/h. Mas em solos compactados essas taxas podem ser reduzidas para 7 a 8 mm/h. Para compensar este outro efeito gerado por ela mesma, a agricultura convencional preconiza a irrigação intensiva, gerando uma demanda cada vez maior por água doce.
Aquecimento do clima.
Com o crescente desmatamento das florestas nativas para a implantação de monoculturas de, principalmente, soja e cana-de-açúcar, além da irregularidade das chuvas, os ventos fortes podem reduzir em até 1/5 a produção agrícola.

Conclui-se que a agricultura convencional está diminuindo cada vez mais as possibilidades da continuação de vida no planeta.

A agricultura orgânica por substituição de insumos
Na agricultura orgânica, os alimentos são menos piores do que aqueles produzidos pela agricultura convencional. Mas esta forma de manejo não faz nada mais que trocar um agente químico por um orgânico. Mas o composto - como a calda bordalesa, por exemplo - também pode ser tóxico e ter efeitos colaterais. No caso da calda bordalesa, quando usado regularmente sobre as folhas causa o excesso de cobre, que provoca doenças bacterianas e viróticas. Os seguintes equívocos podem ser citados com relação a esta forma de manejo:
Continua trabalhando em solos mortos.
Muitas vezes se usam cama de frango de granjas convencionais, bagaço de laranja ou cana de fazendas convencionais, lixo urbano (folhas e cascas de verduras e frutas), acreditando por fim possuir um produto orgânico. Certamente que esses compostos não representam um sal químico, mas sim um material orgânico, no entanto são repletos de agrotóxicos e as culturas com eles adubadas são mais ricas em agrotóxicos que as que recebem agrotóxicos pulverizados via foliar.
Trabalha com arações profundas, revirando o solo até 45 cm de profundidade.
A enorme quantidade de micróbios, principalmente fungos, na camada superficial do solo, produz uma enorme quantidade de antibióticos que são lixiviados pelas chuvas e se acumulam nas camadas mais profundas. Esta camada, quando revolvida à superfície, é instável ao impacto das chuvas. Portanto, virar terra morta para a superfície somente poderá gerar outra laje, pior do que a primeira.
A matéria orgânica é enterrada.
Acreditando que composto seja NPK em forma orgânica e que as raízes se desenvolverão em sua direção em busca de nutrientes, os agricultores enterram-no em 30 a 40 cm de profundidade. Mas, primeiramente, a função do composto e dos estercos não é nutrir a planta diretamente, mas sim os microrganismos, os quais, por sua vez, mobilizarão os nutrientes para a planta. Quando enterrados, eles são decompostos essencialmente por microrganismos anaeróbios, não produzindo CO2 como deveria, mas sim substâncias tóxicas para as plantas, como o gás sulfídrico (SH2) e o metano (CH4). A consequência final disso é que as plantas, além de fermentar suas substâncias e produzir álcool, também desviam seu crescimento radicular em direção às camadas superficiais do solo, resultando numa baixa produtividade.
Mal posicionamento da raiz.
O cuidado com o desenvolvimento das raízes é essencial para o sucesso da agricultura orgânica. Se a muda for bem plantada com sua raiz orientada para baixo e com um solo que não apresente impedimentos físicos e/ou químicos na subsuperfície, sua tendência será a de se desenvolver bem. Mas caso a muda seja mal plantada - o que frequentemente ocorre - a raiz pode se desenvolver lateralmente e não se aprofundar, resultando numa baixa produtividade.
Manejo inadequado da irrigação.
A murcha das plantas logo após 2 ou 3 horas após a interrupção da irrigação não necessariamente indica falta de água no solo. Isto pode ser consequência de mal desenvolvimento radicular ou também por ação do vento (desmatamento). Manejos simples como a manutenção de cobertura morta e a instalação de quebra-ventos podem minimizar em muito a necessidade de irrigação.

O manejo agroecológico
Trabalhar ecologicamente significa manejar os recursos naturais respeitando a teia da vida. O solo é tanto mais aproveitado quanto os manejos agrícolas são feitos conforme as características locais do ambiente, alterando-as o mínimo possível. Assim, verduras e frutas plantadas fora da época e do lugar apropriado para seu cultivo necessitam receber muito mais defensivos para se desenvolver do que quando cultivadas na época natural e no local ecológico. Este tipo de manejo baseia-se em cinco pontos fundamentais:
Solos vivos e bem agregados.
Solo vivo quer dizer que há a presença de variadas formas de organismos. Solos temperados tendem a ser mais ricos quimicamente, enquanto solos tropicais tendem a ser 13 a 50 vezes mais pobres que os de clima temperado. Apesar disso, ecossistemas tropicais têm uma produtividade 5 a 6 vezes superior ao dos ecossistemas temperados. Por exemplo, a mata tropical produz em 18 anos o que a mata temperada produz em 100 anos. Isso se dá porque nos trópicos, além de os solos serem geralmente mais profundos, os nutrientes são mobilizados pela diversificada vida existente neles (90% dos nutrientes encontram-se na biomassa, diferentemente do clima temperado onde 80% dos nutrientes encontram-se no próprio solo).
Biodiversidade.
A manutenção de grande diversidade de plantas em uma mesma área é uma estratégia da própria natureza para manter o ambiente equilibrado, sem a multiplicação descontrolada de nenhum organismo. Por exemplo, determinadas espécies de plantas (como as seringueiras, as castanheiras, o mogno e o pau-brasil) secretam substâncias tóxicas com a função de evitar o nascimento de sua própria semente em um raio de até 50 metros. A matéria orgânica diversificada também induz ao desenvolvimento de variadas formas de vida no solo, e consequentemente, à diversidade de nutrientes mobilizados. Portanto, pode-se dizer que quanto maior for a diversidade de vida na superfície da terra (plantas), tanto maior será a diversidade de vida no interior dela (microrganismos), que mobilizarão o máximo de nutrientes para as plantas. Dessa forma não é preciso procurar o "inimigo natural" porque todos controlam todos naturalmente.
É certo que nos ecossistemas agrícolas a biodiversidade vegetal não pode ser tão grande como nos ecossistemas naturais, no entanto algumas práticas podem contribuir para isso, como:
- Rotação de, no mínimo, cinco culturas na mesma área.
Essa prática muitas vezes encontra limitações em locais onde os mercados não absorvem alguma das espécies em rotação.
- Policultivos que associam várias espécies na mesma área e ao mesmo tempo. Isso é feito, por exemplo, na agrofloresta.
Proteção do solo contra o sol, vento e chuva.
Os solos devem ser cobertos o máximo possível, seja por plantio adensado, mulch (camada de palha) ou mesmo lonas plásticas. Com a manutenção de uma cobertura permanente, mesmo que seja uma fina camada de palha, a água se infiltra com mais facilidade. Além disso, a cobertura também retém a umidade, diminuindo a necessidade de irrigação.
O uso de quebra-ventos, que pode ser feito com capim-napiê, também é necessário para se ter uma boa produtividade.
Bom desenvolvimento da raízes.
Algumas medidas simples podem ser tomadas para incentivar o bom desenvolvimento e a exploração de um grande volume de solo por parte das raízes:
a) o uso de um pau pontudo para fazer a covinha de plantio, orientando a raiz obrigatoriamente para baixo;
b) a poda da raiz;
c) evitar a deficiência de boro, uma vez que esse micronutriente é indispensável para que substâncias fotossintetizadas sejam translocadas das folhas às raízes, permitindo assim o seu bom desenvolvimento.

Em resumo, no manejo agroecológico a natureza não é vista como um amontoado de fatores isolados, mas como um conjunto de sistemas, composto de ciclos. Tudo é dependente, interdependente e relativo. A modificação de um único fator do ecossistema acarreta a modificação de todos os outros fatores. Tudo está interligado.

Clique aqui para entrar no grupo no WhatsApp "Agroecologia Primavesi".

Marcadores:

0 Comentários:

Postar um comentário

Assinar Postar comentários [Atom]

<< Página inicial