Formas de manejar o solo agrícola - convencional, orgânica e agroecológica
Fiz esse "resumo" para um trabalho da faculdade baseado num artigo da Dra. Ana Primavesi que está na edição de setembro/2008 da revista Agriculturas: experiências em agroecologia, que pode ser baixada aqui (caso queiram o artigo original). No meu "resumo" eu incorporei algumas coisas que não estão no artigo, mas que de qualquer forma, praticamente foi tudo pego de outros escritos também da Dra. Primavesi.
Segue o resumo integral do artigo:
O
artigo discorre sobre as três principais formas de manejar o solo agrícola, que
são: o manejo convencional (ou químico), o orgânico por substituição de insumos
e o agroecológico.
Convencional
No manejo convencional,
o solo não é tido como um meio de cultura físico-químico-biológico, mas sim
como um simples suporte físico para as plantas. O artigo cita práticas deste
sistema de manejo que matam os solos:
A
calagem corretiva.
A matéria orgânica se
decompõe rapidamente. O solo se torna duro e muito pobre, pois em clima
tropical – diferente de solo temperado – o uso de grandes quantidades de cálcio
compacta o solo por neutralizar a ação do ferro e alumínio, além de induzir à
deficiência de vários elementos, como zinco, manganês, boro etc. Prova disso é
o projeto “Tatu” em Santo Ângelo/RS, em que aplicaram até 35 t/ha em uma única
vez, causando quase que a desertificação da região.
A
aração profunda.
Anima explosivamente a
microvida do solo e leva a uma decomposição igualmente intensa da matéria
orgânica, o que faz com que, 4 horas mais tarde, uma grossa nuvem de gás
carbônico paire acima da terra. Como em campo lavrado não há planta que possa
aproveitar, essa nuvem eleva-se para a estratosfera, contribuindo para o efeito
estufa.
A
adubação nitrogenada.
Nitrogênio aplicado
como sais de nitrato ou sulfato de amônio favorece a decomposição acelerada da
matéria orgânica por reduzir os teores de C/N. Além disso, mata as minhocas,
acidifica o solo e destrói sua estrutura porosa. Também é importante lembrar
que não existem nutrientes isolados, mas sim em proporções entre si, e o
excesso de nitrogênio induz à deficiência de cobre.
Agrotóxicos.
Para compensar um
efeito de desnutrição vegetal causado por ele mesmo, o manejo convencional
preconiza o uso de defensivos. Como cada defensivo é formado em base de algum
mineral, se frequentemente usado induz a deficiência de outros minerais que
estão em proporção com esse, provocando outras doenças que deverão ser
combatidas por outros defensivos e assim por diante.
Numa experiência em
citros pôde ser constatado que após um ano sem o uso de defensivos, as 11
doenças e pragas que havia reduziram-se a duas. Todas as outras somente eram
"efeitos colaterais".
Herbicidas.
Manter o solo tropical
limpo e exposto ao sol e à chuva leva a um aquecimento extremo (até 74ºC no
Brasil) e a uma alta perda de água. O impacto violento das gotas de chuva com
seus torós compacta o solo, impermeabilizando-o. Além disso, cada planta
espontânea indica alguma situação ou problema que precisa ser corrigido. Por
exemplo, o amendoim-bravo ou leiteirinha, indica a deficiência de molibdênio no
solo. O herbicida mata a leiteirinha, mas a deficiência continua e se agrava a
cada plantio.
Irrigação
intensiva.
Em solos bem manejados,
a taxa de infiltração da água é de 100 a 400 mm/h. Mas em solos compactados
essas taxas podem ser reduzidas para 7 a 8 mm/h. Para compensar este outro
efeito gerado por ela mesma, a agricultura convencional preconiza a irrigação
intensiva, gerando uma demanda cada vez maior por água doce.
Aquecimento
do clima.
Com o crescente
desmatamento das florestas nativas para a implantação de monoculturas de,
principalmente, soja e cana-de-açúcar, além da irregularidade das chuvas, os
ventos fortes podem reduzir em até 1/5 a produção agrícola.
Conclui-se
que a agricultura convencional está diminuindo cada vez mais as possibilidades
da continuação de vida no planeta.
A
agricultura orgânica por substituição de insumos
Na agricultura
orgânica, os alimentos são menos piores do que aqueles produzidos pela
agricultura convencional. Mas esta forma de manejo não faz nada mais que trocar
um agente químico por um orgânico. Mas o composto - como a calda bordalesa, por
exemplo - também pode ser tóxico e ter efeitos colaterais. No caso da calda
bordalesa, quando usado regularmente sobre as folhas causa o excesso de cobre,
que provoca doenças bacterianas e viróticas. Os seguintes equívocos podem ser
citados com relação a esta forma de manejo:
Continua
trabalhando em solos mortos.
Muitas vezes se usam
cama de frango de granjas convencionais, bagaço de laranja ou cana de fazendas
convencionais, lixo urbano (folhas e cascas de verduras e frutas), acreditando
por fim possuir um produto orgânico. Certamente que esses compostos não
representam um sal químico, mas sim um material orgânico, no entanto são
repletos de agrotóxicos e as culturas com eles adubadas são mais ricas em
agrotóxicos que as que recebem agrotóxicos pulverizados via foliar.
Trabalha
com arações profundas, revirando o solo até 45 cm de profundidade.
A enorme quantidade de
micróbios, principalmente fungos, na camada superficial do solo, produz uma
enorme quantidade de antibióticos que são lixiviados pelas chuvas e se acumulam
nas camadas mais profundas. Esta camada, quando revolvida à superfície, é
instável ao impacto das chuvas. Portanto, virar terra morta para a superfície
somente poderá gerar outra laje, pior do que a primeira.
A
matéria orgânica é enterrada.
Acreditando que
composto seja NPK em forma orgânica e que as raízes se desenvolverão em sua
direção em busca de nutrientes, os agricultores enterram-no em 30 a 40 cm de
profundidade. Mas, primeiramente, a função do composto e dos estercos não é
nutrir a planta diretamente, mas sim os microrganismos, os quais, por sua vez,
mobilizarão os nutrientes para a planta. Quando enterrados, eles são
decompostos essencialmente por microrganismos anaeróbios, não produzindo CO2
como deveria, mas sim substâncias tóxicas para as plantas, como o gás
sulfídrico (SH2) e o metano (CH4). A consequência final disso é que as plantas,
além de fermentar suas substâncias e produzir álcool, também desviam seu
crescimento radicular em direção às camadas superficiais do solo, resultando
numa baixa produtividade.
Mal
posicionamento da raiz.
O cuidado com o
desenvolvimento das raízes é essencial para o sucesso da agricultura orgânica.
Se a muda for bem plantada com sua raiz orientada para baixo e com um solo que
não apresente impedimentos físicos e/ou químicos na subsuperfície, sua
tendência será a de se desenvolver bem. Mas caso a muda seja mal plantada - o
que frequentemente ocorre - a raiz pode se desenvolver lateralmente e não se
aprofundar, resultando numa baixa produtividade.
Manejo
inadequado da irrigação.
A
murcha das plantas logo após 2 ou 3 horas após a interrupção da irrigação não
necessariamente indica falta de água no solo. Isto pode ser consequência de mal
desenvolvimento radicular ou também por ação do vento (desmatamento). Manejos
simples como a manutenção de cobertura morta e a instalação de quebra-ventos
podem minimizar em muito a necessidade de irrigação.
O
manejo agroecológico
Trabalhar
ecologicamente significa manejar os recursos naturais respeitando a teia da
vida. O solo é tanto mais aproveitado quanto os manejos agrícolas são feitos
conforme as características locais do ambiente, alterando-as o mínimo possível.
Assim, verduras e frutas plantadas fora da época e do lugar apropriado para seu
cultivo necessitam receber muito mais defensivos para se desenvolver do que
quando cultivadas na época natural e no local ecológico. Este tipo de manejo
baseia-se em cinco pontos fundamentais:
Solos
vivos e bem agregados.
Solo vivo quer dizer
que há a presença de variadas formas de organismos. Solos temperados tendem a
ser mais ricos quimicamente, enquanto solos tropicais tendem a ser 13 a 50
vezes mais pobres que os de clima temperado. Apesar disso, ecossistemas
tropicais têm uma produtividade 5 a 6 vezes superior ao dos ecossistemas
temperados. Por exemplo, a mata tropical produz em 18 anos o que a mata
temperada produz em 100 anos. Isso se dá porque nos trópicos, além de os solos
serem geralmente mais profundos, os nutrientes são mobilizados pela diversificada
vida existente neles (90% dos nutrientes encontram-se na biomassa, diferentemente
do clima temperado onde 80% dos nutrientes encontram-se no próprio solo).
Biodiversidade.
A manutenção de grande
diversidade de plantas em uma mesma área é uma estratégia da própria natureza
para manter o ambiente equilibrado, sem a multiplicação descontrolada de nenhum
organismo. Por exemplo, determinadas espécies de plantas (como as seringueiras,
as castanheiras, o mogno e o pau-brasil) secretam substâncias tóxicas com a
função de evitar o nascimento de sua própria semente em um raio de até 50
metros. A matéria orgânica diversificada também induz ao desenvolvimento de
variadas formas de vida no solo, e consequentemente, à diversidade de
nutrientes mobilizados. Portanto, pode-se dizer que quanto maior for a
diversidade de vida na superfície da terra (plantas), tanto maior será a
diversidade de vida no interior dela (microrganismos), que mobilizarão o máximo
de nutrientes para as plantas. Dessa forma não é preciso procurar o
"inimigo natural" porque todos controlam todos naturalmente.
É certo que nos
ecossistemas agrícolas a biodiversidade vegetal não pode ser tão grande como
nos ecossistemas naturais, no entanto algumas práticas podem contribuir para
isso, como:
- Rotação de, no
mínimo, cinco culturas na mesma área.
Essa prática muitas
vezes encontra limitações em locais onde os mercados não absorvem alguma das
espécies em rotação.
- Policultivos que
associam várias espécies na mesma área e ao mesmo tempo. Isso é feito, por
exemplo, na agrofloresta.
Proteção
do solo contra o sol, vento e chuva.
Os solos devem ser
cobertos o máximo possível, seja por plantio adensado, mulch (camada de palha) ou mesmo lonas plásticas. Com a manutenção
de uma cobertura permanente, mesmo que seja uma fina camada de palha, a água se
infiltra com mais facilidade. Além disso, a cobertura também retém a umidade,
diminuindo a necessidade de irrigação.
O uso de quebra-ventos,
que pode ser feito com capim-napiê, também é necessário para se ter uma boa produtividade.
Bom
desenvolvimento da raízes.
Algumas medidas simples
podem ser tomadas para incentivar o bom desenvolvimento e a exploração de um
grande volume de solo por parte das raízes:
a) o uso de um pau
pontudo para fazer a covinha de plantio, orientando a raiz obrigatoriamente
para baixo;
b) a poda da raiz;
c) evitar a deficiência
de boro, uma vez que esse micronutriente é indispensável para que substâncias
fotossintetizadas sejam translocadas das folhas às raízes, permitindo assim o
seu bom desenvolvimento.
Em resumo, no manejo
agroecológico a natureza não é vista como um amontoado de fatores isolados, mas
como um conjunto de sistemas, composto de ciclos. Tudo é dependente,
interdependente e relativo. A modificação de um único fator do ecossistema
acarreta a modificação de todos os outros fatores. Tudo está interligado.
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